8 Abril, 2020
Covid-19: Porto – CH São João exclui enfermeiros do gozo da tolerância
Em carta envida à administração é solicitado que seja esclarecida a sua deliberação de 6 de abril em que referem que aos enfermeiros não lhes é reconhecido o direito referido no despacho sobre a tolerância de ponto.

 

Expomos o conteúdo da nossa carta ao Conselho de Administração do Centro Hospitalar de S. João:

Na sequência da publicação do despacho n.º 4239/2020, de 7 de Abril, do Primeiro Ministro, e tendo em conta o período de contingência que o país atravessa, deliberou o Conselho de Administração desse Centro Hospitalar que, nos próximos dias 9 e 13 de Abril, deve manter-se a actividade programada considerada inadiável e que, nessa medida, os profissionais que exerçam funções nesses dias – exceptuando serviço de urgência (assim se diz) – poderão gozar tolerância de ponto posteriormente, com o acordo do respectivo serviço.

Se é insofismável que a Pandemia de Covid-19 impõe, no momento, aos profissionais das unidades de saúde que estejam mobilizados para a resposta à mesma, especiais condições de trabalho – sempre com o devido respaldo legal -, não o é menos que dessa circunstância ou, mesmo, do Estado de Emergência decretado, não resulta qualquer possibilidade, a quem quer seja, de restringir, injustificada ou desproporcionadamente, direitos, liberdades e garantias.

Vem isto a propósito do facto de, na deliberação de 6 de Abril do Conselho de Administração a que V. Exa. preside, se excepcionar, no que à tolerância de ponto concerne, a situação dos trabalhadores que exerçam funções no Serviço de Urgência. Diga-se, em abono da verdade, que da redacção da deliberação não se logra discernir se a discriminação de tais trabalhadores é positiva – no sentido de, ao contrário dos demais, só eles podem gozar tolerância de ponto nos dias 9 e 13 de Abril – ou se, pelo contrário, lhes está vedado a eles, e apenas a eles, gozar a dita tolerância de ponto posteriormente.

De todo o modo, há que frisar que não existe qualquer fundamento, de facto ou de direito, que possibilite o tratamento diferenciado de trabalhadores pelo simples facto de trabalharem no serviço A ou no serviço B. Na verdade, e ainda que se permita que trabalhadores afectos a determinadas actividades possam não gozar a tolerância de ponto naqueles precisos dias, parece claro que, sendo concedida a dita tolerância numa determinada entidade, a gozar posteriormente por acordo com o respectivo serviço, a mesma há-de aproveitar a todos os trabalhadores e não apenas a alguns. É que, note-se, da circunstância de vivermos em situação de Estado de Emergência não resulta que o Estado de Direito se tenha, pura e simplesmente, obliterado e que o princípio da igualdade, plasmado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, seja hoje elemento meramente decorativo.

Nessa medida, porque não se descortina qualquer razão para a discriminação entre trabalhadores que a sobredita deliberação de 6 de Abril parece encerrar, solicitamos a V. Exa. que, com a urgência que se impõe, se digne clarificar o exacto sentido da excepção que ali se anuncia, sob pena de, em defesa dos direitos dos nossos associados, nos vermos na contingência de tomar medidas em ordem à reposição da legalidade que se nos afigura violada.

Carta enviada 7 abril 2020