Horas extraordinárias, apoio à família, contratação e retenção de enfermeiros: estes são alguns dos problemas para os quais exigimos resolução.
Era previsível e por isso alertámos e apresentámos propostas de solução. Os dados disponíveis confirmam a “enormidade” do número de horas extraordinárias realizadas em 2021. Até 31 de dezembro os profissionais de saúde realizaram 21,9 milhões (mais 26% relativamente a 2020) sendo que, até setembro, os enfermeiros já tinham realizado mais de 5 milhões de horas extraordinárias.
Estes dados referem-se apenas ao excesso de horas qualificadas pelas instituições como horas extraordinárias. Se associarmos o número de “horas a mais” constantes dos horários (para além do número de horas contratadas) e que não são qualificadas nem remuneradas como tal, então o número efetivo de horas extraordinárias é muitíssimo superior.
Estas horas de trabalho extraordinário, que são realizadas à custa de dias de férias e de tolerâncias não gozadas e dos devidos tempos de descanso e repouso que não se têm, com impacto na vida pessoal e familiar, constituem um dos sintomas da carência de enfermeiros.
Apesar da contratação de enfermeiros efetuada e muito difundida pelo Governo, ainda que muito insuficiente, todos questionam: mas onde estão essas centenas de enfermeiros? Para além da superficialidade da análise matemática propalada, não é considerado, designadamente:
– Por ausência de medidas que valorizem o trabalho dos enfermeiros, por parte do Governo, muitos têm rescindido o seu contrato com as instituições do SNS. Saem profissionais com largos anos de experiência profissional e competências acrescidas e são recrutados jovens profissionais, com as consequências que daí decorrem no plano da organização, funcionamento e capacidade de resposta das equipas de enfermagem;
– Cerca de 83,5% dos enfermeiros são do género feminino, 60% têm probabilidade de deter filhos menores (até aos 12 anos de idade) e exercerem os devidos direitos de proteção na parentalidade. O absentismo nos anos anteriores à Pandemia já atingia os 12-13%. Era previsível que o absentismo por doença (decorrente do esforço acumulado e de infeção por coronavírus SARS-CoV-2), por isolamento profilático e por exercício de diretos de proteção na parentalidade aumentasse exponencialmente. Os publicitados dados relativos a 2021 e relativamente a todos os profissionais de saúde, referem 5,1 milhões de dias de ausência (48,6% por doença e 32,3 por proteção na parentalidade).
Neste quadro, importava perceber se, apesar da contratação de enfermeiros, o número de horas de cuidados de enfermagem disponíveis aumentou na respetiva proporção!
– Relembramos que a alteração do “perfil de utentes/doentes” (idosos/dependentes/comorbilidades) exige disponibilização de mais horas de cuidados de enfermagem.
Ao excesso de esforço acrescido e acumulado e às exigências permanentes com que são confrontados e às quais os enfermeiros têm, exemplarmente, dado resposta, o Governo e Ministério da Saúde não correspondem com as necessárias e possíveis medidas, que, de alguma forma, sejam percecionadas como valorização e reconhecimento do seu trabalho.
Pelo contrário, algumas medidas acrescentam insatisfação e descontentamento. Por exemplo, no que respeita ao “apoio excecional às famílias no âmbito da suspensão das atividades letivas”, é inadmissível que, em situações comprovadas de impossibilidade de partilha, entre progenitores, do exercício do direito de assistência à família, o progenitor que exerce esse direito não receba o apoio equivalente a 100% da remuneração.
Enquanto trabalhadores essenciais e nas citadas circunstâncias é exigível que o referido apoio seja de 100%.
De acordo com os dados inerentes a alguns indicadores relativamente ao quadro pandémico (número crescente de doentes internados, vacinação, etc.), ao período sazonal, ao perfil de saúde dos utentes/doentes e à manutenção da atividade assistencial dita “não Covid”, é uma evidência a necessidade de aumentar o número de horas de cuidados de enfermagem disponíveis.
Assim, é exigível que o atual Governo e Ministério da Saúde, porque emergentes e possíveis, desenvolva várias medidas, nomeadamente:
A | Garantir a admissão de mais enfermeiros com contratos sem termo e a autonomia de contratação por parte das instituições hospitalares;
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B | Com vista à retenção de enfermeiros no SNS, é imperioso emitir orientações relativamente à resolução de vários problemas:
1. Estabelecimento de contratos sem termo com os enfermeiros com vínculo precário, desde logo com os detentores do designado “contrato de substituição”;
2. Contagem de pontos aos enfermeiros alvo do ajustamento salarial para os 1 201€ em 2011, 2012 e 2013 e aos detentores do designado contrato individual de trabalho (CIT);
3. Contagem de pontos aos enfermeiros de várias instituições e em diversas circunstâncias:
- atribuição de pontos relativos ao biénio 2017/2018 nos ACES Almada Seixal e Arrábida e finalização deste processo na ARS Norte;
- atribuição de 1,5 pontos a cada um e todos os anos até 2014 (ARS Lisboa e Vale do Tejo e Norte, ULS Baixo Alentejo, Hospital Santarém, CH Médio Tejo e PPP Cascais);
- Contabilização dos pontos remanescentes do descongelamento para acesso à posição remuneratória seguinte, após transição para as novas categorias de Enfermeiro Especialista e Gestor;
- atribuição de 1,5 pontos ao ano em que os enfermeiros mudaram de escalão (por progressão ou promoção) no segundo semestre (Hospital Évora, CH Leiria/Pombal, outros);
4. Resolução de várias injustiças:
- Dos que tomaram posse em categorias superiores, designadamente na categoria de Enfermeiro Especialista, mediante concursos abertos até setembro de 2009, ou, obtiveram o designado “escalão da formação”;
- A transição para a categoria de Enfermeiro Especialista das enfermeiras que, pelo exercício de direitos de proteção na parentalidade, não transitaram (ARS Lisboa e Vale do Tejo);
- A transição para a categoria de Enfermeiro Especialista de todos os enfermeiros detentores do título de enfermeiro especialista até 31 de maio de 2019, desde logo os que já detiveram a categoria de Enfermeiro Especialista no tempo e nos termos do DL n.º 437/1991;
- A inadmissível desigualdade dos Enfermeiros em “Funções de Chefia” que transitam para a categoria de Enfermeiro Especialista, face aos que transitaram em 1 de junho de 2019;
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5. Urgente concretização da abertura dos Concursos para “consolidação da situação” dos enfermeiros que, em regime de mobilidade, exercem funções nas ARS;
6. Distribuição, pelas instituições, do número de postos de trabalho fixados (Despacho n.º 11398-C/2021) para abertura de concursos para as categorias de Enfermeiro Especialista (1 383 postos de trabalho) e de Gestor (522 postos de trabalho);
C | No sentido de melhorar a resposta aos utentes/doentes e evitar “o crescimento de idas aos serviços de Urgência e internamentos hospitalares”, designadamente:
- Condicionado ao recrutamento do número de enfermeiros necessários, estabelecimento de um plano excecional e temporário de intervenção domiciliária, de “contacto, monitorização e vigilância” do estado de saúde das pessoas idosas, dependentes, com comorbilidades e “mais frágeis”.
. - Reforço do SNS24, nomeadamente admitindo mais enfermeiros e reorganizando processos, procedimentos e o instrumentalmente necessário;
. - Plano de monitorização e fiscalização das instituições da rede de cuidados continuados e ERPI relativamente aos cuidados de saúde, desde logo aos cuidados de enfermagem disponibilizados.