15 Setembro, 2023
Celebram-se hoje os 44 anos do Serviço Nacional de Saúde
O SNS garantiu e garante, foi e é, a maior conquista civilizacional pós 25 de Abril.

Celebram-se hoje os 44 anos do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Amanhã, 16 de setembro, estaremos presentes na ação de luta nacional convocada pela CGTP a exigir o seu reforço.

O SNS não recusa cuidar de nenhum cidadão português ou de outra nacionalidade, não exige dinheiro à “cabeça” para cuidar, não recusa cuidados de saúde ou medicamentos mesmo que sejam inovadores e onerosos, não inicia tratamentos e interrompe-os porque o doente não os pode pagar, não se escusa de enfrentar pandemias ainda que isso possa, por momentos, fazer aumentar as listas de espera.

O SNS salva vidas nas áreas mais remotas, apostando nos melhores e mais eficazes meios – viaturas rápidas de emergência médica e helicópteros – para responder a todo o tipo de necessidades: enfartes, acidentes rodoviários, etc..

O SNS é democrático porque sendo um conjunto de serviços e instituições, potencia a equidade territorial.

O SNS melhorou os indicadores de saúde e forma os melhores e mais competentes profissionais de saúde, que o setor privado e outros países europeus contratam por ausência de políticas nacionais eficazes de retenção.  

O SNS português, a nível europeu, respondeu como nenhum outro à pandemia da COVID-19, quer no tratamento dos milhares de doentes, quer na vacinação de milhões de portugueses.

Mas, se o SNS está hoje numa encruzilhada, é responsabilidade de quem ao longo destes 44 anos o tem governado.

A incapacidade de planear, a longo prazo, as necessidades de profissionais de saúde, dos vários grupos, é disso exemplo – e é uma das razões da diminuição da acessibilidade de 1,7 milhões de portugueses a uma equipa de saúde familiar.

A incapacidade de atuar, conhecendo como seria a evolução do envelhecimento da população com o objetivo de dotar os Centros de Saúde de mais profissionais, nomeadamente enfermeiros para possibilitar cuidar em casa ao invés da institucionalização de pessoas, é outro exemplo.

A contínua suborçamentação, as cativações, a centralização das decisões, as dívidas acumuladas, o desinvestimento nos equipamentos, entre outros, são fatores que fragilizam o SNS.

A situação atual do SNS só pode ser justificada pela opção dos sucessivos governos em manter uma política de transferência de dinheiro público para o setor privado e social.

É disso exemplo a entrega da vacinação contra a gripe e a COVID-19 dos maiores de 60 anos às farmácias. O valor a pagar pelo SNS a estas instituições privadas pode chegar aos 11 milhões de euros! É inaceitável porquanto foi o SNS que vacinou os portugueses durante a pandemia, atingindo uma taxa de cobertura celebrada nacional e internacionalmente.      

Mas existem outros problemas no SNS. Desde logo a gestão das instituições, cujas administrações deveriam ser eleitas e, porque nomeadas, consideram ter mais deveres perante quem os nomeou. Falha a democracia institucional. A gestão é hoje menos participada e imposta de cima para baixo, sem a participação dos profissionais de saúde.

A acessibilidade. Sendo, talvez, o problema que mais queixas gera, a dificuldade na acessibilidade não acontece só pela falta de recursos humanos em algumas áreas ou domínios. Acontece porque os centros de saúde, na sua maioria, apenas funcionam até às 20 horas e estão encerrados aos fins-de-semana; acontece porque ninguém controla (ou quer controlar) a forma como muitas vezes são geradas as listas de espera para consultas ou intervenções cirúrgicas. Como se explica que no programa de recuperação de listas de espera seja possível fazer 10 a 20 cirurgias de uma determinada especialidade e fora desse programa apenas 2, 3 ou 5… ou, que se adquira tecnologia de ponta para habilitar este ou aquele hospital para fazer exames complementares de diagnóstico e, ainda assim, os doentes sejam enviados para o setor privado para os fazer.

O funcionamento porque, por exemplo, é inaceitável que não existam sistemas informáticos comuns a centros de saúde e hospitais, e, em algumas destas instituições, não exista sequer cobertura de rede suficiente. Sim, porque a fibra ótica está muito longe de cobrir todo o território nacional pondo em causa o recurso à telemedicina e à celeridade de respostas. É a equidade e a coesão territorial que continua a faltar. É a teimosia do trabalho por listas de utentes ao invés de área geográfica que duplica recursos na mesma casa, no mesmo prédio, na mesma rua.

E faltam recursos humanos no SNS e os que lá estão não são valorizados como deveriam. Por isso exige-se a valorização das carreiras e o regime de exclusividade. Insistir que os profissionais não o querem porque o seu desejo é trabalhar em mais do que um sítio é falso, e talvez seja assim para alguns. Para a maioria, e cada vez mais, os trabalhadores querem ter uma vida profissional compatível com a vida pessoal e, por isso, caso o trabalho fosse valorizado em termos de salariais, na sua maioria, manter-se-iam apenas no SNS, contribuindo, também, dessa forma, para acabar com a absurda promiscuidade entre público e privado – que só favorece este último. Mas também aos recursos humanos falta uma cultura de trabalho em equipa em que ninguém se sobrepõe a ninguém porque todos, dentro da sua área de competência, têm autonomia para decidir. Infelizmente constata-se a vários níveis um retrocesso a que não é alheio a falta da tal gestão participada.  

Os portugueses merecem mais SNS. Pagam dos seus impostos para que funcione mais e melhor, tenha mais e melhores equipamentos, a investigação seja apoiada e para que se planifique, a longo prazo, as necessidades em recursos humanos.    

Do que o SNS não precisa é da opinião daqueles que o renegaram em 1979 e, muito menos, dos que chamando a si a responsabilidade de o ter criado, muitas vezes o “atraiçoam” com atos e omissões e cedem paulatinamente às políticas neoliberais – atual governo incluído.

O SNS precisa de ser cuidado por todos, tal qual os profissionais cuidam dos doentes.

Nota enviada aos media a 15 de setembro de 2023