5 Setembro, 2022
Centro de Estudos Sociais: o lucros das empresas e a inflação
Banco Central Europeu: são os lucros excessivos das empresas que alimentam a inflação. Ainda assim, o Governo não quer taxar os lucros excessivos nem aumenta salários.

 

Para melhor podermos compreender o agravamento das desigualdades à boleia da inflação galopante em curso, publicamos esta informação do CES. Aqui podemos constatar que o pagamento de dividendos aos acionistas nas empresas da Europa cresceu, no segundo trimestre deste ano, 28,7% em comparação com o período homólogo.

 

Aumento da remuneração dos acionistas é 7 vezes mais rápido que o dos salários.

Novos números revelam que as empresas europeias neste verão pagaram aos seus acionistas dividendos muito acima da inflação, pois dizem a seus trabalhadores que enfrentam a crise do custo de vida que não têm direito a um aumento salarial decente.

De acordo com o Índice Mundial dos Dividendos recentemente publicado por Janus Henderson, o valor da remuneração dos acionistas aumentou 28,7% na Europa durante o segundo trimestre deste ano.

É sete vezes mais rápido do que a taxa de aumento dos salários na União Europeia.

De acordo com o Banco Central Europeu estes números mostram mais uma vez que são os lucros excessivos das empresas – e não os salários – que estão a alimentar a inflação.

A diferença entre as quotas aplicáveis ​​ao pagamento de dividendos e salários na Europa também contribui para a queda da parcela do PIB destinada aos trabalhadores em relação à destinada aos gestores e acionistas, e isso enquanto os investimentos das empresas para o futuro ainda estão abaixo dos níveis de pandemia.

É por isso que a CES exorta os governos europeus a:

  • introduzir um imposto inevitável sobre os lucros excessivos,
  • a impor um limite ao montante dos bónus e dividendos e
  • a apoiar a negociação coletiva como a melhor forma de garantir uma remuneração justa.

 

Esther Lynch, Secretária Geral Adjunta da CES, explica:

“Esses números serão difíceis de acreditar para milhões de trabalhadores que lutam para lidar com a crise do custo de vida. Mais uma vez fica claro que existe uma regra para os ricos e outra para os pobres.»

“Os trabalhadores estão a ser informados de que agora não é hora de dar-lhes um aumento salarial ainda que os acionistas bebam champanhe para comemorar seus salários bem acima da inflação.»

“É um duplo insulto para os trabalhadores porque as empresas não pagam um salário digno e os salários existentes são ainda mais desvalorizados pelo aumento da inflação.»

“É hora de acabar com esse escândalo. Tributar lucros excessivos e garantir aumentos salariais justos para os trabalhadores.»

 

O BCE afirma: “Muitas empresas conseguiram aumentar os lucros por unidade num ambiente de excesso de procura global, apesar do aumento dos preços da energia” e “em média, os lucros contribuíram fortemente para a inflação doméstica total bem acima da sua contribuição histórica.»

Aumento salarial esperado – Base de dados de salários nominais per capita da Comissão Europeia Ameco

Parcela salarial corrigida – Base de dados Ameco da Comissão Europeia sobre a parcela salarial corrigida.

 

Lia-se no artigo de Leonor Mateus Ferreira (jornal de Negócios, 30 de agosto de 2022) o segundo trimestre deste ano foi o melhor de sempre para os dividendos. Baseando-se nas projeções da Janus Henderson, espera-se que os dividendos em 2022 atinjam 1,56 biliões de dólares.

Os dividendos do segundo trimestre totalizaram 544,8 mil milhões dólares, uma subida de 11,3% face ao período homólogo, de acordo com o índice agregado pela gestora de ativos britânica. Apesar da desaceleração económica, não só ficaram em níveis pré-pandemia como representaram o melhor trimestre de sempre.

A Europa Continental e o Reino Unido foram os grandes condutores deste crescimento, com um aumento no trimestre de 28,7% e 29,3%, respetivamente. Esta escalada tem efeitos sazonais já que a generalidade das empresas na Europa (excluindo o reino Unido) distribui dividendos apenas uma vez por ano – como é o caso de Portugal -, mas houve uma normalização após o período travão na remuneração acionista. Da mesma forma, a reversão das restrições à remuneração acionista sugeridas por parte dos bancos centrais também teve impacto. As fabricantes automóveis alemãs foram especialmente generosas para os acionistas.

Em sentido contrário, os mercados emergentes foram castigados pela guerra na Ucrânia. O cancelamento de pagamentos na Rússia, no seguimento da invasão da Ucrânia, gerou o colapso de três quartos dos dividendos (equivalente a 6,1 mil milhões de dólares).

Este efeito foi mais do que compensado pelo impacto positivo da crise energética.

O disparo no preço do petróleo levou a um aumento dos dividendos das petrolíferas de 14 mil milhões de dólares, dos quais metade vieram da petrolífera Petrobras – a empresa líder nos “payouts” no segundo trimestre – e grande parte do restante valor da colombiana Ecopetrol.

Apesar da guerra, a robustez dos números, do período entre abril e junho de 2022, prolongou a tendência de recuperação que se vivia o ano passado, com as empresas a melhorarem margens de lucros e a subirem vendas.

Face a estas melhorias, a gestora de ativos Janus Henderson reviu em alta as projeções para a totalidade do ano, antecipando um reforço para 1,56 biliões de dólares (contra a anterior estimativa de 1,54 biliões) e 5,8% acima dos 1,47 biliões registados em 2021.