11 Novembro, 2017
Greve 11 a 15 de setembro: faltas injustificadas
Faltas injustificadas a sócios do SEP por terem aderido à greve da FENSE: partilhamos consigo o comunicado da direção sobre a intervenção deste sindicato, em sua defesa, junto das Administrações Regionais de Saúde.

Os termos da intervenção:

1 –   Como melhor se sabe, na linha da jurisprudência constitucional (ver os acórdãos do Tribunal Constitucional nºs 118/97, 160/99 e 636/2006), a jurisprudência administrativa também reconhece às associações sindicais legitimidade processual ativa para exercerem o direito à tutela jurisdicioal efetiva para defesa coletiva de direitos e interesses coletivos e para defesa coletiva de direitos e interesses individuais legalmente protegidos de trabalhadores que representem, sem outorga de expressos poderes de representação e sem prova da filiação dos trabalhadores directamente lesados (ver o acórdão do STA, de 6/fevereiro/2003, Procº nº 01785/02.Tb. o acórdão do TCA Sul, de 25/maio/2013).

Isto “por não estar aí em causa um direito de representação jurídica ou judiciária ou o exercício de um mandato, mas uma competência própria dos sindicatos em consideração dos fins que lhe estão constitucionalmente cometidos” [Carlos Alberto Fernandes Cadilha, “A legitimidade processual dos entes associativos” in “Cadernos de Justiça Administrativa”, nº 101 setembro/outubro 2013), pág. 11].

 

2 –   O Código do Procedimento Administrativo trata no seu artº 68º da legitimidade procedimental postulando no seu nº 1 que têm legitimidade para iniciar o procedimento ou para nele se constituirem como interessados os titulares de direitos, interesses legalmente protegidos, deveres, encargos, ónus ou sujeições no âmbito das decisões que nele forem ou possam ser tomadas, bem como as associações, para defender interesses coletivos ou proceder à defesa coletiva de interesses individuais dos seus associados que caibam no âmbito dos respectivos fins.

 

3 –   Vem isto a propósito do que se vai seguir:

4 –   Associados nossos têm vindo a ser notificados para, no quadro da audiência prévia, se pronunciarem sobre faltas injustificadas – motivadas por adesão à greve instalada entre os dias 11 e 15 de setembro de 2017, cujo aviso prévio terá, alegadamente, sido irregular.

5 –   O Código do Procedimento Administrativo trata no artº 121º do direito de audiência prévia e o artº 122º cuida da notificação para a audiência, estatuído o nº 2 que a notificação fornece o projeto de decisão e demais elementos necessários para que os interessados possam conhecer todos os aspetos relevantes para a decisão, em matéria de facto e de direito.

6 –   Ora, das notificações a que tivémos acesso em nenhuma delas consta o projeto de decisão, em contravenção com o estatuído no artº 122º, nº 2, do Código do Procedimento Administrativo (o anterior CPA não tinha esta exigência: artº 101º, nº 2) – e, por isso, à notificação falta-lhe aptidão para produzir os efeitos a que tende: é ineficaz.

7 –   O que fica invocado para todos os devidos e legais efeitos.

8 –   Por outro lado, não é apresentado qualquer elemento de facto que permita apurar a regularidade, ou não, da declaração de greve.

9 –   O que fica igualmente invocado, para todos os devidos e legais efeitos.

 

10 – Aliás, não há qualquer Entidade Pública (mesmo quando pessoa coletiva Estado, em sentido estrito) que, no desempenho da função administrativa, tenha, entre as finalidade de interesse público cuja prossecução é posta por lei a seu cargo, o poder de, unilateral e autoritariamente, declarar a invalidade ou irregularidade de um aviso prévio de greve (não tem esta atribuição).

11 – Ora, qualquer ato de Entidade Pública a descoberto das suas atribuições é juridicamente nulo, com incontornável propagação aos ulteriores atos que nele se alicercem (o ato nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de nulidade: artº 162º, nº 1, do Código do Procedimento Administrativo).

12 – O que também fica invocado, para todos os devidos e legais efeitos.

 

13 – Suponhamos agora (hipótese meramente académica, claro, pois a notificação não fornece o projeto de decisão nem elementos de facto relevantes, bem como não mostra quaisquer normas ou princípios jurídicos estribadores do que anuncia) que o aviso prévio da greve não teria respeitado o prazo legal em apenas um dia.

14 – Nesta hipótese de trabalho só o primeiro dia de greve (11 de setembro de 2017) não estaria credenciado.

15 – Na verdade, o aviso prévio é mera condição procedimental para a instalação de greve declarada.

16 – Ou, nas palavras de Pedro Romano Martinez, a greve só se pode iniciar depois do decurso do prazo de cinco (ou dez) dias subsequente ao aviso prévio (in, com destacado nosso, “Código do Trabalho”, Anotada, Almedina, 2016, 10ª edição, pág. 1123).

17 – A esta luz, os dias subsequentes ao primeiro dia de greve estarão bastantemente credenciados por inoperância da irregularidade: utile per inutile non vitiatur (o que, na dogmática administrativa, se analisa no princípio do aproveitamento do acto).

18 – Assim, relativamente aos dias 12, 13, 14 e 15 de setembro de 2017 nenhuma falta é cominável de injustificada.

19 – Ainda, na hipótese de trabalho com que estamos a lidar, restaria o primeiro dia de greve: 11 de setembro de 2017.

 

20 – Ora bem: entre os princípios reitores da atividade administrativa inclui-se o princípio da proporcionalidade: artº 266º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa, e artº 7º do Código do Procedimento Administrativo.

21 – O qual, na linha da impressiva, e bem conseguida, imagem de Jellinek se analisa em não se poder atirar aos pombos com tiro de canhão (v. Santos Botelho, Pires Esteves e Cândido de Pinho, “Código do Procedimento Administrativo”, Anotado e Comentado, Almedina, 1992, nota 10, a págs. 55).

22 – Ora, relativamente a este dia os interessados já sofreram ablação patrimonial (o vencimento correspondente) pelo que estaria em contravenção com o princípio da proporcionalidade (no subprincípio da ingerência mínima), ainda lhe fazer acrescer a injustificação da falta, dados os inerentes efeitos legais.

 

23 – Assim, solicitamos de V. Exª seja a presente intervenção procedimental admitida e conhecida, em toda a sua extensão e alcance.