
Na qualidade de organização de classe que representa e defende os interesses dos enfermeiros, e em particular dos seus associados, o Sindicato dos Enfermeiros Portugueses exalta o papel dos enfermeiros expresso neste manifesto.
Para o Sindicato dos Enfermeiros Portugueses, os enfermeiros são profissionais imprescindíveis e insubstituíveis na promoção da saúde e prevenção da doença, no tratamento, na reabilitação, na investigação, no ensino e na inovação, no desenvolvimento de projetos com impacto no acesso das pessoas a cuidados de saúde, incluindo os cuidados continuados e paliativos e em todos os contextos, à população reclusa, às e nas forças armadas, aos migrantes (independentemente da sua origem) com ou sem permissão de residência, aos turistas que nos visitam e também no INEM, no IPST, na Saúde Pública e no setor privado e no social.
Pela natureza das funções, os enfermeiros são peritos em detetar problemas, identificar necessidades, para em conjunto com outros profissionais, intervir com vista à obtenção de ganhos em saúde dos indivíduos, grupos ou comunidades.
A carência de enfermeiros em Portugal, e na Europa, é uma realidade reconhecida, com tendência para se agravar face à evolução da pirâmide etária prevista. Em 2000, a percentagem de pessoas com 65 anos ou mais era de 16%, em 2023 aumentou para 21% e perspetiva-se que em 2050 seja de 30%.
Portugal é um dos países a nível mundial com maior taxa de envelhecimento populacional e, simultaneamente, com menor qualidade de vida (comorbilidades) após os 65 anos. Razão pela qual, já hoje, enfrenta um exponencial aumento das necessidades em saúde e, previsivelmente, com tendência a acentuar-se no futuro imediato.
A degradação das condições socioeconómicas contribui para o agravamento do estado de saúde da população, criando novos desafios aos profissionais de saúde, quer pelo aumento de doenças reconhecidamente associadas à pobreza, quer pelo desinvestimento da pessoa/família na promoção da sua saúde (hábitos alimentares saudáveis, prática de exercício físico, etc.), que passa a ter como prioridades as necessidades básicas e a subsistência.
A pouca atratividade da carreira, nomeadamente o baixo valor atribuído ao trabalho dos enfermeiros, a penosidade inerente à natureza da profissão, a desregulação dos horários, a dificuldade em conciliar a vida pessoal e familiar com a vida profissional, entre outros, são as principais causas que levam muitos a preferir outros destinos que não o Serviço Nacional de Saúde. É urgente criar as condições para a fixação destes profissionais no país, que contribuam para a sua segurança, valorização e desenvolvimento profissional.
Por outro lado, é crucial que na prestação de cuidados de saúde passe a existir uma efetiva integração das várias disciplinas que intervêm nos determinantes em saúde, organizando as profissões em equipas multiprofissionais, colocando a pessoa no centro do seu Plano Individual de Saúde.
Ao final de um ano, o modelo de organização das Unidades Locais de Saúde não só não deu resposta à autonomia das instituições, ao investimento em meios humanos e materiais e a uma maior integração de cuidados, como ainda contribuiu para uma secundarização e desvalorização dos Cuidados de Saúde Primários, nomeadamente nas áreas da saúde comunitária e saúde pública, e para a instabilidade dos profissionais.
Por consequência, as urgências hospitalares continuam a evidenciar tempos de espera inaceitáveis, mais doenças crónicas descompensam, os internamentos aumentam, a prevenção é minimizada, a literacia em saúde diminui, com todas as implicações na saúde das pessoas, na pressão sobre os serviços, no agravamento dos custos económicos e sociais.
É com preocupação que assistimos à intenção de injustificada criação de cinco novas PPP na saúde, abrangendo 5 hospitais e 174 centros de saúde, sem qualquer evidência das vantagens para as pessoas e erário público, a par da anunciada criação de USF Modelo C sem o necessário prévio estudo legalmente exigido e a possibilidade de contratação externa no âmbito das ULS, agora incluindo também as ECCI.
As dificuldades sentidas no SNS e decorrentes de muitos anos de desinvestimento não podem servir de argumento para transferir os cuidados para o setor privado que, pela sua natureza, tem como objetivo o lucro. Objetivo esse que é incompatível com o direito ao acesso universal e à generalidade dos cuidados, que só o Serviço Nacional de Saúde, público, universal e gratuito, previsto na Constituição Portuguesa, poderá garantir.
O Sindicato dos Enfermeiros Portugueses declara como relevante que:
- Serviço Nacional de Saúde:
- Seja feito um saneamento financeiro a todas as instituições, libertando os Conselhos de Administração do estrangulamento que os impede de negociar melhores preços junto dos fornecedores
- Seja incrementado um plano centralizado de compras de equipamentos e materiais, garantindo escala, o que permitirá diminuir os preços, incluindo dos medicamentos
- Que as políticas públicas de saúde sejam efetivamente centradas na promoção da saúde e na prevenção da doença
- Sejam adotadas medidas que consagrem a separação entre os setores público e privado
- Seja repensado e alterado o atual modelo de financiamento das organizações integrantes do SNS, garantindo-lhes mais autonomia e incorporando nos pressupostos, nomeadamente, o nível de risco da população, a obtenção de ganhos em saúde e as intervenções dos diferentes grupos profissionais
- Sejam criados os Sistemas Locais de Saúde na esfera do serviço público como prevê a Lei de Bases da Saúde, sendo determinante que ao nível da organização, funcionamento, direção e gestão do dispositivo organizacional se tenha em consideração:
– A existência de equipas multiprofissionais nos Cuidados de Saúde Primários (enfermeiros, médicos, psicólogos, nutricionistas, farmacêuticos, assistentes sociais, fisioterapeutas, estomatologistas, higienistas orais, etc), com vista à prestação de cuidados personalizados, globais e integrados, imprescindíveis à melhoria dos indicadores de saúde da população
– Que as equipas multiprofissionais estabeleçam Planos de Cuidados Individuais Integrados, garantindo efetivas respostas de proximidade às pessoas, grupos e comunidades, nomeadamente, em contexto domiciliário, ao longo das 24 horas
– Que no âmbito da complementaridade funcional, sejam revistas as atuais Normas de Orientação Técnica, de forma a valorizar as competências dos vários grupos profissionais, nomeadamente dos enfermeiros, com vista a garantir qualidade, eficiência e a potenciar os resultados
– Um plano de formação de longo prazo, cujo objetivo seja potenciar a complementaridade funcional das equipas multiprofissionais, que entre outros aspetos.
- Integre formação conjunta de todos os profissionais, no que respeita a áreas científicas partilhadas (“tronco comum”), em particular na fase de formação pré-graduada
- Estabeleça, para todas as profissões de saúde, um sistema de formação qualificante ao longo da vida profissional
- Que seja estabelecido um plano de médio prazo, que enquadre medidas de organização, funcionamento e investimento no SNS, em toda a sua latitude (recursos humanos, dispositivos médicos e equipamentos) cujo objetivo seja garantir que o diagnóstico, o tratamento e a reabilitação se concretizem dentro do Serviço Nacional de Saúde. A circularidade dentro do dispositivo público de prestação de cuidados de saúde deve garantir, por exemplo, que todas as Vacinas e todos os Exames Complementares de Diagnóstico prescritos nos Cuidados de Saúde Primários devam ser realizados nas Unidades Locais de Saúde.
- Que os presidentes das Administrações das instituições do SNS sejam seriados mediante prévio concurso público e que o Enfermeiro Diretor e o Diretor Médico sejam eleitos pelos seus pares.
2. À Enfermagem e aos Enfermeiros:
- Que a formação em Enfermagem integre o subsistema Universitário do Ensino Superior
- Que sejam recrutados novos enfermeiros, com vínculo definitivo, e se proceda à conversão dos atuais vínculos precários em vínculos sem termo
- Que todos os enfermeiros que exerçam em instituições públicas, independentemente do vínculo, tenham as mesmas regras e direitos laborais e sociais
- Que seja promovida a contratação coletiva, nomeadamente através da revogação da norma da caducidade das convenções coletivas de trabalho, redução da carga horária semanal para 35 horas e a valorização das carreiras e salários nos setores privado e social
- Que seja garantida formação contínua, imprescindível para garantir prestações de cuidados de excelência, humanizados e atualizados, tendo em conta os avanços científicos e tecnológicos
- Que aos Enfermeiros seja contado todo o tempo de serviço para efeitos de desenvolvimento salarial e corrigidas as injustiças decorrentes das últimas revisões de carreira, incluindo a valorização da grelha salarial no contexto de um acentuado aumento do custo de vida
- Que sejam corrigidas as injustiças que permanecem na contabilização de pontos para efeitos de progressão
- Que sejam pagos os retroativos à data do direito à progressão, a partir de 2018
- Que seja negociado um regime remunerado de dedicação exclusiva
- Que sejam compensados o risco e a penosidade inerente à natureza das funções, designadamente através de regime específico que garanta condições de acesso mais favoráveis à aposentação/reforma.
De acordo com a Organização Internacional de Trabalho (OIT) estima-se que um trabalhador que trabalhe por turnos envelhecerá prematuramente cinco anos por cada 15 que trabalhe por turnos, incluindo o turno noturno.
- Que se cumpra a legislação sobre horários de trabalho, nomeadamente, os tempos de descanso e o limite legal da jornada diária de trabalho (8 horas)
- Que os princípios da Segurança e Saúde passem a ser uma realidade nos locais de trabalho, tornando-os saudáveis, incluindo maior proteção à saúde mental dos enfermeiros
- Que seja consagrado um Sistema de Avaliação do Desempenho justo e adequado à especificidade das intervenções e funções dos enfermeiros.
Na qualidade de organização de classe que representa e defende os interesses dos enfermeiros, e em particular dos seus associados, o Sindicato dos Enfermeiros Portugueses exalta o papel dos enfermeiros, mormente o contributo que dão no âmbito da promoção de estilos de vida saudável, na prevenção da doença, bem como no cuidar das pessoas, no ensino e na investigação.
É na convicção de que a proteção da saúde é um direito de todos os cidadãos e um dever constitucional do Estado, que esta Organização alicerça todas as reivindicações, justas, e que venham a ser necessárias, com vista a garantir que todos os cidadãos tenham acesso a profissionais de enfermagem altamente qualificados, dignamente remunerados e continuadamente motivados.
Lisboa, abril de 2025