29 Agosto, 2024
“Não percebemos o descontentamento”
A administração da ULS Algarve escolhe a comunicação social para responder às exigências dos enfermeiros. 

Na sequência da greve dos enfermeiros na Unidade Local de Saúde do Algarve (ULSAlg) a 22 e 23 de agosto, a administração afirmou junto da comunicação social que «cumpre escrupulosamente» a legislação laboral em vigor e todas as orientações da tutela e da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), pelo que «não se revê nos fundamentos e reivindicações invocadas» pelo SEP para a greve que convocou.

Com uma adesão nos dois dias que rondou os 70%, diríamos que, os enfermeiros deram a resposta adequada, ao Conselho de Administração. Os enfermeiros não fazem greve, com prejuízo próprio, sem razões fortes para tal!

O Conselho de Administração nada fez evitar esta paralisação. Não reagendou a reunião que desmarcou, não resolveu nenhum dos problemas, pelo contrário, tem vindo a agravá-los.

Analisamos ponto por ponto as afirmações do Conselho de Administração:

Sobre os milhares de dias de feriados e de folgas não gozadas, a administração da ULSAlg afirmou que este processo «está a ser alvo de análise jurídica, para que se possa efetuar de forma mais consentânea com o previsto na lei». Importa esclarecer que existem dezenas de enfermeiros que já comprovaram e reclamaram de dívidas com mais de 10 anos que a administração teima em não pagar. O SEP apresentou uma proposta de pagamento destas horas que a administração ainda não se dignou a responder pretendendo “reconhecer o esforço” dos enfermeiros pagando estes dias como trabalho “normal”.

Sobre a afirmação «não regista qualquer dívida por trabalho extraordinário realizado no âmbito da pandemia, nem qualquer reclamação neste âmbito, pelo que não compreendemos que o descontentamento», voltamos a sublinhar que enfermeiros há que já solicitaram o pagamento de trabalho efetuado no âmbito da pandemia e este continua a não ser reconhecido e pago.

Sobre o pagamento dos retroativos desde 2018, resolução das “injustiças relativas” e aplicação do acelerador de progressões a ULSAlg tem autonomia para pagar os retroativos desde 2018 aos enfermeiros a CIT e não o faz. Sempre afirmou concordar com os nossos argumentos jurídicos e assumiu não recorrer de qualquer decisão de um Tribunal que desse razão aos enfermeiros. Não cumpriu.

E, praticamente 2 anos após sair a lei sobre a contabilização de pontos e orientações para resolução das “injustiças relativas”, a ULSAlg vem dizer que «está a terminar o complexo processo de correção das remunerações dos enfermeiros, em todos os casos em que houve inversão das posições relativas». Quando a DGS publica uma norma, os enfermeiros cumprem-na. Exige-se igual procedimento por parte da administração, ou seja, assim que é publicada uma lei, que seja cumprida com igual celeridades e seriedade. O atraso na conclusão destes processos redunda em dinheiro que já deveria estar “no bolso” dos enfermeiros.

 A ULSAlg não cumpre o regulamento de horários e impõe horários de 12 horas. A carência de enfermeiros que tem vindo a agravar-se por ausência de medidas de retenção, obriga os enfermeiros a fazerem milhares de horas extraordinárias e, consequentemente, a não poderem gozar os períodos de descanso a que têm direito. A legislação determina a ilegalidade dos turnos de 12 horas e o trabalho extraordinário programado. A administração não cumpre nem um nem outro. De salientar que a desregulação dos horários de trabalho é uma das principais razões dos pedidos de exoneração dos enfermeiros, o que resulta num agravamento da situação identificada.

A ULSAlg afirma ainda que relativamenteao pagamento de incentivos nas USF, apesar de alguns constrangimentos que vão sendo assinalados e rapidamente corrigidos por força da forma como neste momento é processado o trabalho e os incentivos às equipas, consideramos que, no geral, o processo de pagamento de incentivos está a ser bem assegurado». Os constrangimentos não são da responsabilidade dos enfermeiros. Mais uma vez a legislação existe e ao compromisso assistencial que determinou a criação das Unidades de Saúde Familiar (USF) modelo B está associado o pagamento de incentivos aos profissionais e os institucionais. Os enfermeiros não podem ser prejudicados pelos constrangimentos existentes.

Diz o CA da ULSAlg que “aposta na formação e desenvolvimento dos seus profissionais”. A questão é como? A administração parece não conhecer a legislação já que os profissionais têm direito à formação em serviço e à formação contínua e, relativamente a esta última, continuam os pedidos dos enfermeiros a serem recusados. Como a administração sabe porque decorre da lei, ao final de cada ano, as horas por direito previstas para a formação continua não tendo sido utilizadas, têm que ser pagas. É mais uma dívida aos enfermeiros.

E, sobre os Cuidados de Saúde Primários, é vergonhoso que as Unidades de Cuidados na Comunidade (UCC) cuja missão é prestar cuidados à população vulnerável, que integram a rede dos Cuidados Continuados e assumem visitas domiciliárias, com diversos projetos de intervenção na e para a comunidade  estejam a ser “despejadas” das suas instalações para dar lugar às USF modelo B. Veja-se o caso do Centro de Saúde de Portimão e de Lagoa, ou até do novo edifício de Loulé cujo espaço para a UCC estava previsto ocupar 1000 metros quadrados, com balneários adequados às necessidades da equipa e com circuito de limpos e sujos e agora foi reduzido para 400 metros quadrados, com balneários minúsculos e sem circuito de limpos e sujos. Uma vergonha!

Por fim, admiramos a coragem da administração que afirma que “o processo de avaliação de desempenho dos enfermeiros também se encontra devidamente cuidado, estando a Direção de Enfermagem já a preparar o próximo ciclo avaliativo». Importa esclarecer que, por exemplo, no biénio em curso 2023/2024 as primeiras entrevistas foram efetuadas no final de 2023, ou seja, um ano depois do que deveria ter acontecido e, num contexto de alteração para Unidade Local de Saúde todos os objetivos foram traçados de acordo com a existência de um Centro Hospitalar. Em falta, também, as notificações dos enfermeiros que recorreram à ponderação curricular no biénio 2021/2022.

À custa destes atrasos e para além dos acima referidos, está por aplicar o “acelerador de progressões” com claro prejuízo dos enfermeiros. Relembramos que todos os que se aposentaram e/ou pediram exoneração no decurso de 2024, e caso fossem contemplados, têm direito ao pagamento dos retroativos a janeiro de 2024.

Tal como o Conselho de Administração da ULSAlg «manifesta toda a sua disponibilidade para continuar a trabalhar em conjunto com o SEP no sentido de, em conjunto e de forma partilhada, encontrarmos as melhores soluções para os interesses dos nossos enfermeiros, da instituição e do SNS», também nós estamos, como sempre estivemos. É por essa razão que estranhamos que a reunião de 23 de julho tenha sido adiada sem previsão de reagendamento e o pedido de reunião para discutir as propostas apresentadas à proposta de Regulamento da ULSAlg ainda não tenha sido, também ela, agendada.

Continuaremos a exigir a resolução dos problemas dos enfermeiros