8 Julho, 2016
Reunião e entrega de exposição ao deputado do PCP, Miguel Tiago "Pela melhoria da capacidade de resposta dos serviços de saúde da ULS da Guarda".

 

 

Exmo. Senhor Deputado
Acreditando que a génese de qualquer organização passa pelo envolvimento dos seus profissionais. A teoria da complexidade e a sua aplicação pode ajudar a compreender como desenvolver uma Rede de Cuidados de Saúde como estratégia para uma Unidade Local de Saúde (ULS).

É acreditando ter sido acertada a solução organizativa em ULS dos serviços de saúde do nosso distrito que julgamos necessário aqui apresentar alguns considerandos, para em seguida os podermos neste documento, oportunamente confrontar com a realidade que vivenciamos:

  1. A constituição de uma ULS significa uma agregação funcional “em rede” de níveis diferentes de prestação de cuidados e um instrumento de articulação e complementaridade desses cuidados, onde a essência seja a melhoria substancial da circulação dos doentes entre os diferentes níveis de cuidados;
  2. Uma ULS tem como missão formal identificar ativamente as necessidades de saúde das populações por ela abrangida e dar-lhes uma resposta integrada, oferecendo um contínuo de cuidados e serviços de fácil acesso e circulação que permitam ganhos em saúde, com eficiência técnica e social;
  3. Uma ULS objetiva melhorar a interligação dos centros de saúde com os hospitais e com todas as outras entidades ligadas à saúde regional ou local. Procura rentabilizar a capacidade hospitalar instalada, através da definição de uma carteira de serviços de diagnóstico e terapêutica, criar consultas hospitalares, regulares, nos centros de saúde a partir dos principais serviços hospitalares de referenciação, articular projetos que visem uma boa continuidade dos cuidados de saúde, instalar meios complementares de diagnóstico e terapêutica para os cuidados de saúde primários, numa base de parceria e cooperação entre os hospitais e os centros de saúde e partilhar uma central de compras e de custos;
  4. A ULS da Guarda EPE constituída em outubro de 2008, tem como missão proporcionar serviços públicos de saúde que permitam a maior abrangência de cuidados à população da sua área de influência e a todos os cidadãos em geral, num projeto partilhado e global que vise a obtenção de Qualidade, Acessibilidade, Eficácia e Eficiência, contribuindo também para o futuro sustentável do Serviço Nacional de Saúde;
  5. A ULS Guarda, EPE tem como referencial comum o primado do cidadão, a conciliação das estratégias de saúde (regionais e nacionais) e a otimização dos recursos disponíveis. E deve prosseguir uma cultura orientadora de cuidados personalizados e de excelência, tendo, entre outros, por objetivos:
  • Proporcionar à população abrangida o acesso aos cuidados e a satisfação das suas necessidades em saúde, com níveis de qualidade acrescidos;
  • Prestar cuidados de saúde de qualidade, em tempo oportuno, e em ambiente humanizado;
  • Eficácia, eficiência e oportunidade, num quadro de desenvolvimento económico e financeiro sustentável;
  • Desenvolver projetos de prestação de cuidados de saúde em ambulatório e ao domicílio, de saúde pública, familiar e escolar;
  • Desenvolver e fomentar a integração de cuidados de saúde, garantindo a complementaridade dos cuidados prestados aos cidadãos e promovendo sinergias entre os estabelecimentos hospitalares, centros e extensões de saúde, com vista à rentabilização e á melhoria dos cuidados de saúde prestados;
  • Criar dinâmicas de formação e investigação em que o conhecimento seja também um pólo de atração de Recursos Humanos e desenvolver as ações de formação necessárias ao desempenho dos seus trabalhadores, assegurando o seu desenvolvimento profissional.

Após todos estes considerandos, volvidos mais de sete anos da sua constituição, a realidade orgânica e funcional da ULS da Guarda EPE, é para nós, dirigentes do Sindicato de Enfermeiros portugueses (SEP), em alguns aspetos preocupante, sendo de salientar:

– A carência dos profissionais de saúde é demais evidente e poe em causa a qualidade dos cuidados prestados, bem como o risco de futura perda de algumas valências.

No que respeita aos profissionais de enfermagem, estes embora disponíveis no desemprego e abundantes no processo de emigração, a única condição necessária para a sua fixação no nosso território, deveria passar apenas pelo cumprimento das dotações seguras exigidas. Prova clara da falta destes profissionais é o número avultado de horas que a instituição deve aos enfermeiros (acima de 4000h, só no Hospital Sousa Martins). O recurso a empresas externas para substituir profissionais de saúde é uma inaceitável prática da administração da ULS da Guarda EPE, que o atual governo deve por cobro, além da destruição do emprego com vínculo público e o favorecimento de interesses privados, estes muitas vezes de multinacionais em detrimento do interesse público. Neste momento são 33, os enfermeiros subcontratados via empresa Randstad, que exercem funções na ULS da Guarda, todos eles, com o mesmo conteúdo funcional, subordinação hierárquica e com horário completo.

A este respeito é importante aqui referir que o anterior governo PSD/CDS tentou “engendrar” uma solução jurídica para desvalorizar uma recente vitória sindical, ao assegurarmos contrato individual de trabalho a tempo indeterminado para mais de quatro dezenas de enfermeiros que exerciam funções permanentes na ULS, mas sob contrato precário, na base de falsos recibos verdes.

Apesar da notória falta de enfermeiros, temos assistido ao garrote financeiro da ULS da Guarda para permitir um número de vagas suficiente para suprir as necessidades permanentes. Não podemos aceitar que a “chaga” da precariedade e da subcontratação seja alastrada agora a uma multinacional, a Randstad, que para além da exploração dos enfermeiros subcontratados, estes auferem apenas uma remuneração base de 1020 euros/40 horas, enquanto todos os outros colegas auferem a remuneração base de 1201 euros, com a agravante de onerar o erário público com a subcontratação.

O SEP denuncia que o caminho não pode e nem deve fomentar-se numa política de promoção de instabilidade e precariedade dos vínculos laborais com o sistemático recurso à contratação de profissionais através de empresas de trabalho temporário, como referimos a Ranstad, caminho traçado pelos anteriores governos e que neste momento se mantem. Defendemos a contratação de enfermeiros com vínculos permanentes para funções permanentes, pois só assim conseguimos fixar jovens profissionais no interior, infelizmente esquecido.

Todos os enfermeiros, que atualmente exercem funções, correspondem a necessidades permanentes, tendo em conta que a grave carência na ULS da Guarda é cerca de centena e meia de enfermeiros, tendo em conta as dotações seguras e a perspetiva de reforço dos cuidados saúde primários e abertura de novos serviços, nomeadamente no HSM e HNSA. Do levantamento feito pelo SEP perante o cumprimento das dotações seguras, bem como a reposição das 35 horas e aplicação das mesmas a todos os enfermeiros, independentemente do vínculo laboral são necessários pelo menos 138 enfermeiros. Porém, o CA da ULS da Guarda, com a passagem às 35h, só solicitou para debelar esta necessidade 60 enfermeiros, ficando assim este número muito aquém das reais necessidades.

  • A ineficaz articulação entre os cuidados hospitalares e os cuidados de saúde primários, dificulta a boa continuidade dos cuidados, bem como não contribui para prevenir a doença e “aliviar/evitar” os abundantes episódios de urgências hospitalares. De referir também que, embora os investimentos realizados nos meios informáticos, estes encontram-se ainda carenciados em equipamentos e desajustados no seu processo. O sistema informático de registos SClínico em meio hospitalar e nos CSP, apesar dos recentes esforços, demonstra não permitir uma real continuidade do processo de registo em rede de forma a fluir a informação necessária a potenciar a real e necessária continuidade de cuidados dos utentes.
  • O fracasso na implementação do processo de enfermeiro de família, para nós fulcral na resposta às necessidades das populações numa perspetiva de intervenção holística. Os grandes ganhos em saúde ao longo das últimas três décadas deveu-se ao nível dos cuidados de saúde primários, estes integrados no Serviço Nacional de Saúde (SNS), os quais constituem função central e são o principal núcleo, onde os enfermeiros têm um contributo inestimável desde logo, no cumprimento do Plano Nacional de Vacinação. Não basta afirmar politicamente que os Cuidados de Saúde Primários são a primeira porta de acesso aos cuidados de saúde, quando não vimos e não vemos opções políticas para a sua importância estratégica, embora sendo estes reconhecidos mundialmente devido aos avanços nos ganhos em saúde registados em Portugal depois da Revolução de Abril. Perante o projeto de diploma do governo relativo à regulamentação dos atos das profissões de saúde, este como instrumento de destruição da autonomia da enfermagem, esta plasmada no Regulamento Exercício Profissional de Enfermagem (REPE). Temos esperança que o governo PS com os contributos do PCP, PEV e BE ponham travão à fragmentação dos CSP, desde logo com a criação das unidades funcionais, onde a multiplicidade de funções que os enfermeiros exercem nas respostas às necessidades dos utentes, sejam ao nível da vacinação, saúde infantil, saúde materna, ou ao nível dos cuidados continuados integrados;
    – O subaproveitamento dos equipamentos instalados, nomeadamente na área da imagiologia (RMN), bem como a gritante falta de recursos potencia a demora na realização de exames necessários e imprescindíveis que se repercute na demora média de internamentos, bem como no recurso à telemedicina com tempos médios de espera em algumas situações superiores a três horas.
  • O desajustado funcionamento da rede de cuidados continuados integrados, com deficitário funcionamento das equipas de gestão de altas hospitalares, desajustada referenciação de doentes deles necessitados, bem como, a preocupante e por vezes pouco transparente parceria público-privada, muitas vezes “travestida” de IPSS, com carência de dotações seguras em cuidados de enfermagem, que ninguém fiscaliza e controla, como é exemplo da UCCI de Manteigas, Guarda e Fornos de Algodres.
  • O modelo “encapuçado” de privatização de parte dos Cuidados de Saúde Primários, a ocorrer se o modelo C das USF proliferar, verificando ser estas as únicas unidades funcionais a merecerem alguma atenção, por parte do anterior governo, em detrimento das demais (UCC, UCSP, USP) sediadas nos Centros de Saúde.

A experiência do nosso desempenho, tem demonstrado que a aposta pura e simples em indicadores numéricos e meramente financeiros, evidencia uma política de progressivo desinvestimento nos cuidados de saúde primários por via da diminuição da sua capacidade de resposta, da desvalorização social e profissional dos enfermeiros que neles trabalham e, sobretudo, da carência de dotação de recursos humanos, financeiros e técnicos que possibilitem a assunção dos objetivos que norteiam a prestação neste nível de cuidados de saúde.
O anterior governo PSD/CDS aprofundou a ofensiva contra o SNS, onde os cuidados de saúde primários, não foram exceção, tendo como exemplo, a UCSP de Gouveia que integrou o projeto piloto do enfermeiro de família, quando este nunca saiu do papel. E mais, os colegas nunca foram auscultados sobre o processo, sendo isto bem demonstrativo da mera propaganda para esconder a política de desinvestimento público. Acrescentando como agravante, a inaceitável modelação do acesso ao SNS através da implementação de taxas moderadoras nos atos de enfermagem.

Em consequência, tendo em consideração os dados por todos conhecidos, referentes ao elevado índice de envelhecimento e aos elevados graus de dependência de grande parte da população do distrito. Os cuidados de saúde primários degradam-se de forma acelerada, privando os cidadãos de um direito fundamental consagrado na Constituição da República Portuguesa, o direito à saúde, este assente na promoção da saúde e prevenção da doença, onde os mais idosos não podem ser excluídos dos cuidados médicos e de enfermagem públicos prestados. Sendo disso um dos piores exemplos, a situação verificada em algumas freguesias do concelho de Seia, como Vide e outras, em que no passado recente se encerraram várias extensões de saúde, perdendo a oferta pública de cuidados de enfermagem e médicos. Obrigando hoje os utentes, na sua maioria idosos e de parcos recursos financeiros, que impossibilitados de se deslocarem ao CS mais próximo por falta de transportes, a terem custos de 10 Euros para ter acesso a uma simples consulta médica.

O argumento falacioso da segurança, quando a ULS da Guarda investiu mais de 60000 euros em protocolos formativos com o INEM em termos de formação avançada e básica de vida, faltando ainda a implementação do laboratório formativo no que respeita ao SAV. Pois, todos os profissionais de saúde deveriam deter formação obrigatória em SBV, bem como enfermeiros e médicos formação em SAV. Sendo neste contexto de salientar a exigência da DGS de um algoritmo de resposta no momento de vacinação no que diz respeito ao risco de choque anafilático (Programa Nacional de Vacinação 2006. Orientações Técnicas Nº: 08/DT DATA: 21/12/05 Para: Todos os médicos e enfermeiros dos serviços dependentes do Ministério da Saúde, subsistemas de saúde e do sector privado).

Exmo. Senhor Deputado
A exigência reivindicativa do SEP de aplicação das 35 horas a todos os enfermeiros é justa e democrática. Atualmente apenas 437 enfermeiros na ULS da Guarda reconquistaram o horário de trabalho semanal de 35 horas. Salientamos ainda que apenas há 17 CIT a 35 horas e os restantes 197 enfermeiros com CIT mantêm 40 horas, embora desempenhando idêntico conteúdo funcional.

O primeiro ataque começou em 2002 com alteração da lei da gestão hospitalar, pela mão do governo PSD/CDS, infelizmente o PS não alterou e em alguns aspetos agravou-se com a alteração da figura jurídica de SA para EPE, quando o SEP sempre defendeu uma genuína articulação entre os cuidados de saúde, sejam eles primários, hospitalares, continuados, paliativos ou outros. Salientando neste contexto, a figura dos Sistemas Locais de Saúde com efetiva responsabilização, mas advinda de uma genuína autonomia administrativa e financeira.

A carência de recursos humanos é uma realidade bem patente no interior do País, bem sentida na ULS da Guarda EPE. E sabemos que a carência não se cinge apenas aos enfermeiros, mas no que a estes diz respeito, é imperioso a melhoria das suas condições de trabalho, bem como a aplicação das 35 horas para todos, tendo em conta o princípio da igualdade.

Somos trabalhadores que exercem funções públicas como os demais, não compreendemos, que a Assembleia da República aprove legislação laboral com hiatos legislativos que contrarie uma promessa eleitoral. Todos exercemos as mesmas funções, os deputados do PCP têm responsabilidades acrescidas na exigência da igualdade em torno da carga de trabalho.

As nossas justas reivindicações são no sentido de por fim à desvalorização e ataque aos direitos dos enfermeiros, que nos últimos anos se traduziu na gravidade sem precedentes: cortes nos salários, destruição das carreiras e dos direitos laborais, desvalorização dos cuidados diferenciados e especializados, agravamento das condições de trabalho, aumento da carga horária, da precariedade e da instabilidade nas relações laborais. Tudo isto, atualmente agravado por um putativo projeto de lei acerca dos atos profissionais.

Exmo. Senhor Deputado
No sentido de fortalecer a capacidade de resposta do Hospital Sousa Martins como organização nuclear da ULS da Guarda para maior segurança em saúde da população do nosso distrito, julgamos também imperioso: a par da recente otimização da via verde AVCs, a cobertura eficaz da via verde coronária, a implementação das equipas de emergência interna, num contexto agregado de via verde sépsis, bem como da equipa de emergência interna. Salientando, neste contexto a importância da Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente que sediada no novo edifício, já hoje dá resposta a muitas das lacunas e carências vivenciadas no dia-a-dia da instituição. Apesar da moderna estrutura física, ainda subaproveitada, que gozando hoje do estatuto de serviço da ULS e após recente certificação do colégio de especialidade que lhe permite apostar no processo formativo, poderá ser potenciada se reforçados os seus recursos humanos.

O SEP entende o papel nuclear da Assembleia da República. E é tendo em conta a correlação de forças à esquerda, algumas das quais o PS e o PCP, que defenderam e aprovaram os alicerces do SNS, que aqui defendemos a revitalização da rede de cuidados de saúde primários de proximidade. Pois, uma verdadeira resposta às reais necessidades de prestação de cuidados de saúde às populações é imperiosa. Assim, atendendo às características geográficas do nosso distrito, à falta de rede transportes públicos em grande parte do nosso território, atendendo às características demográficas e epidemiológicas do meio envolvente e às condições sociais e económicas das populações. A maioria dos enfermeiros refere que a ULS da Guarda EPE não tem dado cumprimento a um dos seus primordiais objetivos “Proporcionar à população abrangida, o acesso aos cuidados e a satisfação das suas necessidades em saúde, com níveis de qualidade acrescidos”. Bem como não tem cumprido, em pleno, a sua a missão, de “proporcionar serviços públicos de saúde que permitam a maior abrangência de cuidados à população da sua área de influência e a todos os cidadãos em geral, num projeto partilhado e global que vise a obtenção de Qualidade, Acessibilidade, Eficácia e Eficiência, contribuindo também para o futuro sustentável do Serviço Nacional de Saúde”.

Exmo. Senhor Deputado
Sabendo que o atual Conselho de Administração solicitou a contratação de 94 enfermeiros à ACSS, que no nosso entender são insuficientes, solicitamos que fomentem a construção de uma resolução ou recomendação ao governo PS de um plano articulado de contratação de profissionais de saúde que combata a grave carência, principalmente no Interior do País onde destacamos o distrito da Guarda.